DESCOBRIMENTO DO BRASIL Embora tenha sido uma jornada militar, um empreendimento comercial e uma missão diplomática, a viagem de Pedro Alvares Cabral - em meio a qual o Brasil foi descoberto - foi também, e acima de tudo, uma aventura extraordinária. Privilegiar os aspectos aventurescos da expedição de Cabral se justifica plenamente, não apenas porque sua viagem de fato foi repleta de ação e de terríveis naufrágios, combates marítimos e terrestres, encontro com povos e terras desconhecidas e inúmeros outros episódios dramáticos, mas principalmente porque, desta forma, é muito mais fácil e mais agradável compreender seus múltiplos significados. A lição da História Ao percebermos com clareza que a viagem de Cabral foi realizada por homens de carne e osso - com desejos e temores, com anseios e expectativas, premidos pela fome e pela sede, lutando por glória e por dinheiro -, nossa capacidade de nos identificarmos com aqueles marinheiros, soldados e capitães aumenta enormemente. Tal identificação permite que nos coloquemos de imediato no lugar dos grumetes e dos degredados, dos comandantes de origem nobre e dos pilotos de vasto saber, enfrentando os perigos do Mar Tenebroso, penetrando nos escuros e insalubres porões de suas diminutas caravelas, desembarcando nas praias paradisíacas do sul da Bahia - e seguindo viagem com eles rumo à longínqua Índia. Dessa maneira, como num passe de mágica, a História deixa de ser uma seqüência enfadonha de nomes e datas para se transformar naquilo que ela de fato é: um processo orgânico e múltiplo, repleto de ação e aventura; com sangue, sexo, ganância, coragem e hombridade. A História começa a se explicar por si própria e se desvenda como um fluxo de acontecimentos interligados, revelando de onde viemos e nos permitindo antever para onde vamos. Aqueles que não conhecem a própria História estão condenados a repeti-la. Os que sabem como e porque estão aqui, se encontram preparados para interferir e transformar o próprio curso da História. A História não pode ser aprisionada nos bancos da escola. A História está viva: pulsa, lateja e vibra no raiar de cada novo dia. Acompanhar passo a passo a viagem de Cabral - episódio inaugural da História oficial do Brasil - é uma viagem virtual da qual cada passageiro emerge com uma nova visão do mundo, munido das ferramentas que o transformam de mero espectador em agente efetivo, em sujeito histórico cujas ações podem ter reflexos reais na construção da nação. Redescobrir o Brasil Na escola, a viagem de Cabral e o descobrimento do Brasil se resumem a um episódio histórico aparentemente grandiloqüente -, mas tedioso. Por algum motivo, jamais ficamos sabendo que boa parte dos 1500 tripulantes da frota que zarpou de Lisboa no dia 9 de março de 1500 tinha, em média, 15 ou 16 anos de idade, e que muitos deles não apenas jamais haviam navegado como foram recrutados a força em pequenas cidades do interior de Portugal. Ninguém nos conta o que comiam e bebiam esses homens ao longo dos quase seis meses em que permaneciam em alto-mar. Quanto ganhavam eles? O que pensavam? O que esperavam? Quantos sobreviveram? De que forma morreram aqueles que jamais retornaram para a sua pátria? O que sentiram ao verem uma terra repleta de flores e frutos desconhecidos, habitada por um povo desnudo que, aparentemente, se limitava a dançar pelas praias de areias claras e águas tépidas? Por que dois grumetes desertaram da expedição e se deixaram ficar entre os nativos? Quem eram e por que choravam os dois degredados abandonados no Brasil? Para além desses aspectos mais lúdicos e mais particulares, temos sido privados também de dados econômicos fundamentais. Quanto custou a viagem de Cabral? Quem a financiou e com qual objetivo? Qual o preço de uma nau e de uma caravela em 1500? De que forma, onde e por quem tais embarcações foram construídas? Quanto Pedro Alvares Cabral recebeu para chefiar aquela missão e porque foi ele o escolhido? Por que sua viagem mudou o curso da história econômica da Europa? Essas respostas são todas conhecidas e, uma vez de posse delas, nos vemos preparados para entender muito mais plenamente - e com muito mais prazer e lucidez - o que de fato significou a descoberta do Brasil e qual o alcance da jornada comandada por Cabral. Ao descobrirmos as motivações que levaram o rei D. Manoel a enviar uma monumental frota de 13 embarcações da Europa até a Índia, estamos prontos para redescobrir o Brasil. E redescobrir o Brasil cinco séculos após o desembarque de Cabral é uma autêntica viagem de autoconhecimento. MARIA SOCORRO
Enviado por MARIA SOCORRO em 22/04/2006
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